Agricultores denunciam violência rural e até casas queimadas à CPI sobre grilagem de terras em RR


Relatos foram colhidos na primeira reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Terras, em Rorainópolis. Comissão foi criada após denúncia do Ministério Público de Contas (MPC) contra presidente do Instituto de Terras e Colonização de Roraima (Iteraima), Dilma Lindalva Pereira da Costa. Grilagem de terras: ocorre primeira reunião de CPI que investiga grilagens em Rorainópolis
Casas queimadas, plantações destruídas e agressões. As denúncias são de moradores vítimas de grilagem de terras na região Sul de Roraima aos deputados estaduais que integram a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), instaurada para apurar a existência de uma organização criminosa dedicada à ocupação ilegal de terras públicas envolvendo o governo de Roraima.
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Os relatos foram colhidos na primeira reunião da CPI, realizada na última segunda-feira (26), na Câmara Municipal de Rorainópolis, a pedido do próprio presidente da Casa, Marcinho (PP).
A criação da CPI das Terras foi motivada por denúncia encaminhada pelo Ministério Público de Contas (MPC) solicitando o afastamento da presidente do Instituto de Terras e Colonização de Roraima (Iteraima), Dilma Lindalva Pereira da Costa. Ela é suspeita de integrar um esquema de grilagem de terras públicas e favorecimento indevido na regularização fundiária da Gleba Baliza, no sul de Roraima.
🔎 A grilagem, também chamada de roubo de terras, é a ocupação ilegal e fraudulenta de terras públicas, que em alguns casos ocorre por meio de documentos falsos para a obtenção de títulos de propriedade.
Entre os moradores ouvidos está a presidente da Associação Equador, Adriana Cunha de Souza, de 40 anos. Ela reside na vicinal Zé Valdo, que segundo ela, é alvo de grileiros há ao menos três anos.
‘Fui agredida’
Em um dos episódios, ela chegou a ser agredida por policias em uma ação de reintegração de posse realizada em 2022, que agora tramita na Justiça. Os produtores protocolaram documentos para regularizar a situação da terra no Instituto de Terras e Colonização de Roraima (Iteraima) em 2021, mas no ano seguinte foram surpreendidos com a decisão judicial que favorecia o suspeito de grilagem.
“A gente foi surpreendido com a reintegração de posse da extensão e eu estava lá na área pedindo para os pessoal sair para não acontecer nenhum conflito e através disso eu sofri o conflito. Fui agredida [pelos policiais], levei ferimentos, meu esposo também. Então, essa CPI hoje para mim é muito importante, porque já sofremos muito lá. Eu fui agredida, meu marido também, as pessoas que moravam lá tiveram suas casas queimadas”, denunciou.
Adriana Cunha é presidente da Associação Equador
Samantha Rufino/g1 RR
Ainda no depoimento, Adriana denunciou que quando esteve na sede do Iteraima em 2022 viu a filha do grileiro trabalhando como secretária. “Essa filha dele trabalha no Iteraima, eu não sei se trabalha mais, porque quando a presidente [do Iteraima] Dilma já tava, eu fui, ela ainda tava, não sei agora”.
Ao menos 70 famílias moram na região desde 2013 e têm como atividade principal a agricultura. A esperança de Adriana é que o Iteraima regularize a regularização das terras.
‘Falta de respeito’
A situação é semelhante a vivida pelas famílias do projeto Morada Nova, na vicinal 26, em São Luiz, segundo o presidente da Associação local Geilson Lima da Silva. Na região vivem 96 famílias que aguardam a titularização das terras, mas enfrentam impasse com um fazendeiro.
Os produtores plantam banana, macaxeira, arroz e milho, mas sem a regularização, não conseguem escoar a produção. O pedido para titularizar as terras foi protocolado no Iteraima em 2021, após a área ser passada da União para o Estado.
“Os grandes fazendeiros têm apoio, e o homem do campo ele não tem o total apoio […] Hoje o que nós estamos vendo aqui é só um pouco da proporção causado pela falta de transparência do órgão que é o Iteraima em relação às terras do nosso Estado”.
Geilson Lima é presidente da Associação Morada Nova
Samantha Rufino/g1 RR
Aos deputados, Geilson relatou que os moradores chegaram a ser coagidos pela Polícia Militar, que acompanhou a abertura de uma área de mata feita pelo fazendeiro, que segundo ele tenta grilar as terras da região para vender madeira ilegal.
“Ele [grileiro] esteve lá acompanhado com alguns PMs, que eu achei meio injusto o PM acompanhar trator de esteira para estar abrindo ramal dentro de estrada. É uma falta de respeito com o cidadão, com o agricultor, porque eu respeito as autoridades, eu respeito desde que ela seja feita com transparência”.
‘Queimou nossas casas’
Os problemas não se resumem às terras do Estado. Em Caracaraí, na região do Novo Paraíso, moradores da vicinal dos Pampas, tiveram casas queimadas e plantações destruídas por grileiros, segundo a presidente da Associação Marta Valéria Riberio Sales, de 58 anos.
De acordo com ela, a área é um acampamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), mas diversos invasores tentam conseguir a posse da região por meio de documentos falsos. Ela relembra que em 2022, mais de 20 barracos dos moradores foram queimados.
No mesmo ano, a Justiça de Caracaraí decidiu em favor do grileiro e após a associação recorrer, a decisão foi revogada. No entanto, o impasse se estende a outros invasores, que também entraram na Justiça para reintegração de posse.
“O grileiro acabou com a nossa roça, queimou nossas casa, botou capim dentro da nossa roça, dos nossos arroz. Então, é muito difícil para gente. O nosso povo está passando necessidade. A gente precisa de ajuda dos deputados, senadores”, pediu.
Marta Valéria é presidente da Associação em Caracaraí
Samantha Rufino/g1 RR
CPI das Terras
A CPI das Terras foi instaurada na última quinta-feira (20) e tem como presidente o deputado estadual Jorge Everton. Foi ele quem presidiu a reunião.
“Nós vamos juntar toda a documentação que o relator solicitou e a partir daí iremos nos debruçar, inclusive fazendo diligências, porque as denúncias são graves e elas precisam ser apuradas. Nós vamos responsabilizar aqueles que realmente estiverem errados. Esse é o trabalho da CPI e a comissão vai continuar trabalhando”, disse.
Na ocasião, o relator Renato Silva apresentou o plano de trabalho, que inclui o acompanhamento in loco, análise com GPS e realização de oitivas com os envolvidos. “Tudo isso é um trabalho que vai ser feito minucioso, com muita responsabilidade, sem apontar culpados antes da hora, nós temos que ter responsabilidade no que vai ser falado e ser exposto na CPI”, explicou o relator.
Também fazem parte da CPI os deputados Armando Neto (PL), vice-presidente, Marcinho Belota (PRTB), Chico Mozart (PRTB), Neto Loureiro (PMB) e o presidente da Casa, Soldado Sampaio (Republicanos).
Presidente da Ale-RR, soldado Sampaio, conversa com a presidente do Iteraima Dilma Pereira e deputado Jorge Everton
Samantha Rufino/g1 RR
A CPI foi instaurada por suspeita de irregularidades na Gleba Baliza, no Sul de Roraima. Na última segunda-feira (17), o MPC pediu o afastamento de Dilma por suspeita de grilagem de terras na região. Em maio do ano passado, pequenos produtores da região Gleba Baliza já indicavam preocupação com a regularização fundiária na região em uma audiência pública promovida pela Assembleia Legislativa de Roraima.
As suspeitas do MPC contra ela incluem favorecimento indevido na regularização fundiária da Gleba Baliza, estimada em 904 mil hectares, além de grilagem e prejuízos que podem chegar a R$ 1,3 bilhão para os cofres públicos. Na reunião da CPI, ela rebateu as acusações.
“A partir daquela audiência pública, eu, ouvindo os depoimentos das pessoas e conversando com o governador Antonio Denarium a respeito, ele me deu toda autonomia para atuar na Gleba Baliza. Então, a partir dali, o que que nós fizemos? Imprimimos toda a urgência possível no georreferenciamento, porque não há como regularizar uma área que não não tá as parcelas numa área que ainda ela não foi regularizada. A Gleba Baliza, ela não está regularizada”, rebateu.
Na quinta-feira, mesmo dia em que a CPI, foi instaurada o MPC pediu ao Tribunal de Contas do Estado (TCE-RR) o afastamento imediato dela por conceder descontos irregulares em títulos definitivos de terras rurais e criar uma estrutura paralela de consultoria jurídica. A denúncia também destaca um prejuízo aos cofres públicos estaduais estimado em R$ 229.035,83.
Moradores que tenham denúncias sobre grilagem de terras podem entrar em contato com a CPI por meio do número (95) 98423-4691. As informações podem ser enviadas de forma anônima.
Primeira reunião da CPI ocorreu em Rorainópolis
Samantha Rufino/g1 RR
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