
Áudio obtido pela reportagem mostra que servidor teria alertado direção sobre risco que Jackson Peixoto Rodrigues, mais conhecido como Nego Jackson, corria. Polícia Civil investiga o crime. Jackson Peixoto Rodrigues, 41 anos, foi morto dentro de cadeia por outro detento
Divulgação/Polícia do Paraguai
Um áudio obtido pelo Grupo de Investigação da RBS (GDI) revela que o policial penal Luigi Munhoz Barbosa teria alertado com antecedência a direção da Polícia Penal, antiga Superintendência de Serviços Penitenciárias (Susepe), sobre um plano de assassinato do detento Jackson Peixoto Rodrigues, conhecido como Nego Jackson, 41 anos.
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Jackson, considerado pela Polícia Civil um chefe de grupo criminoso e ligado a pelo menos 29 homicídios, foi atingido por oito tiros dentro da cela onde cumpria pena na Penitenciária Estadual de Canoas (Pecan) em novembro de 2024.
A mensagem teria sido enviada na véspera do crime ao diretor do Departamento de Segurança e Execução Penal do órgão, Anderson Prochnow.
“Os caras estão se articulando pra pegar e apagar ele”, diz Munhoz no áudio, que também é investigado pela Polícia Civil.
De acordo com o policial penal, o alerta teria sido feito em 22 de novembro de 2024, uma sexta-feira. Nego Jackson foi morto no dia seguinte.
“Tão logo eu recebi essa informação, eu passei para a cadeia hierárquica competente”, confirmou Munhoz ao GDI.
A arma foi localizada no corredor do presídio após os disparos. Dois presos foram indiciados pelo homicídio e denunciados pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul em dezembro do ano passado. Segundo o MP, os suspeitos foram acusados pela prática de crime de porte ilegal de arma de uso restrito, bem como homicídio triplamente qualificado da vítima.
A Polícia Civil segue investigando outros possíveis envolvidos e as circunstâncias do crime. Ainda não se sabe como o armamento entrou no local.
A Polícia Penal, em nota, explicou que “todos os procedimentos necessários foram imediatamente realizados” após o recebimento do áudio de Luigi Munhoz Barbosa. O conteúdo foi informado à Delegacia Penitenciaria Regional – Setor Operacional e ao Setor de Inteligência da Polícia Penal, explica. Leia na íntegra abaixo.
Como foi o crime
A reportagem do GDI apurou que os suspeitos estavam em uma cela em frente à da vítima, um espaço que deveria isolar líderes de facções rivais. Durante a contagem dos presos, os dois saíram da cela. Um se aproximou da portinhola para atrair Nego Jackson para perto da porta e o outro efetuou os disparos.
Antes de morrer, o próprio detento havia denunciado, por carta, a fragilidade da estrutura. Ele afirmava que o espaço destinado ao isolamento abrigava presos de facções inimigas separados apenas por portinholas.
A Polícia Civil instaurou um inquérito para apurar as circunstâncias da morte. A delegada Graziela Zinelli, do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) da Polícia Civil disse que a posição dos presos no momento do crime e os motivos para estarem ali permanecem sob sigilo.
A reportagem solicitou entrevistas com o diretor da Polícia Penal, Anderson Prochnow, e com o secretário de de Sistemas Penal e Sócio-Educativo, Jorge Pozzobom. As pastas se manifestaram por meio de nota conjunta, informando que todas as providências foram adotadas após o recebimento do áudio e do bilhete.
Disse ainda que recebe diariamente diversas denúncias e informes, muitos deles falsos, mas que todos são “tratados com seriedade”.
A pasta afirmou também ter intensificado medidas de segurança na Pecan, como a remoção de suspeitos de facilitar o acesso à comunicação via celular e o reforço em revistas nas celas.
O diretor do Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), delegado Mário Souza, confirmou que o áudio com o alerta está sob investigação.
“Um elemento como esse pode implicar em algum tipo de omissão por parte de quem poderia, quem sabe, ter evitado esse crime”, disse. A investigação corre sob sigilo.
‘Tem que afastar o apenado’, diz especialista
Consultado pela RBS TV, o ex-comandante-geral da Brigada Militar e especialista em segurança pública, coronel João Carlos Trindade, afirma que o preso deveria ter sido imediatamente removido após o alerta.
“Isso é indelegável e até impostergável. Tem que afastar o apenado, preservar a vida, que é um bem maior”, afirmou.
Segundo o coronel, o risco não era apenas para o preso, mas também para os agentes penitenciários e para a segurança pública fora da prisão, uma vez que mortes dentro do sistema prisional podem desencadear represálias nas ruas.
“Pode ter tiroteio, bala perdida, pode ter morte de pessoas que não têm nada a ver com isso”, alertou.
O que dizem as secretarias envolvidas
A Polícia Penal informa que desde a morte do apenado Jackson Peixoto Rodrigues, no dia 23 de novembro de 2024, dentro do Complexo Prisional de Canoas, o governo adotou uma série de ações para o reforço da segurança deste e de outros estabelecimentos prisionais do Estado.
Como primeira medida, em parceria com outros órgãos de segurança, desarticulou o comércio ilegal instalado no entorno do Complexo Prisional de Canoas, onde havia a suspeita de facilitação da transmissão de sinal de celular para os apenados, coibindo a permanência irregular de barracas nas proximidades da unidade. Para não deixar os visitantes desassistidos, as visitas utilizam o abrigo de visitas em frente à Penitenciária Estadual de Canoas 1 (Pecan 1).
Outra providência é a atuação constante do Grupo de Ações Especiais (GAES) e do Grupo de Intervenção Rápida (GIR) realizando revistas pontuais e extraordinárias na unidade e a instalação do telamento na galeria de triagem.
Em novembro, o governador Eduardo Leite efetivou a entrega do novo Módulo de Segurança Máxima da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), na Região Carbonífera. O módulo conta com 76 celas individuais, que são destinadas, prioritariamente, para líderes e mandantes de grupos criminosos envolvidos com homicídios dolosos, inviabilizando, a partir do isolamento, qualquer tipo de comunicação. Logo após a morte registrada no Complexo, diversos líderes foram transferidos para este local.
A respeito do bilhete e do áudio enviados um dia antes do assassinato do preso Jackson Peixoto Rodrigues ao diretor do Departamento de Segurança e Execução Penal da Polícia Penal à época, a Instituição informa que todos os procedimentos necessários foram imediatamente realizados, sendo os conteúdos informados a Delegacia Penitenciaria Regional – Setor Operacional e ao Setor de Inteligência da Polícia Penal.
Cabe ressaltar que, diariamente, inúmeras denúncias e informes são recebidos no sistema prisional, na sua quase totalidade anônimos e falsos, com o intuito de promover desordem, desestabilidade e caos. Todos eles, porém, são tratados com seriedade e com a responsabilidade necessária para a segurança de todos os envolvidos: servidores e pessoas privadas de liberdade.
No comando da Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo há um mês, o secretário Jorge Pozzobom monitora de perto o caso. Além disso, buscando o constante aprimoramento do sistema, elencou seis ações estratégicas como norteadoras da gestão, a chamada Matriz Sortes. Elas priorizam a segurança pública; as obras; a assistência religiosa; o trabalho prisional; a educação e os servidores.
Ainda, é importante salientar que, dentro da sua estratégia para melhorar o sistema prisional, o governo do Estado tem aportado investimentos históricos no sistema prisional. De 2019 a 2026, os recursos aplicados na área terão ultrapassado o valor de R$ 1,4 bilhão. Até o fim do governo, a Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo prevê a construção de cinco novas unidades prisionais, a ampliação de outras quatro, e a entrega da readequação da Cadeia Pública de Porto Alegre. Tudo isso demonstra a preocupação constante com a qualificação do sistema prisional e da segurança pública.
Sobre o andamento do Inquérito Policial
A Polícia Civil informa que o crime foi inicialmente apurado por meio de um Inquérito Policial, no qual os atos praticados na ocasião foram esclarecidos. Duas pessoas foram presas em flagrante por envolvimento direto no homicídio, e o procedimento foi devidamente concluído e remetido ao Poder Judiciário, com individualização de condutas e delimitação das responsabilidades.
Paralelamente, um segundo Inquérito Policial encontra-se em andamento com o objetivo de verificar se há eventual participação de outros indivíduos em condutas acessórias relacionadas aos fatos. Essa medida reforça a ampla apuração sobre o fato.
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