Investidores de empresa de criptomoedas no RS buscam ressarcimento após falência e fraude financeira


Indeal operava no mercado de criptomoedas sem a devida autorização do Banco Central, segundo investigações da Polícia Federal. Grupo entrou em falência em 2021. Notas do real
Reprodução/ RBS TV
Muitos credores ainda buscam recuperar seus recursos perdidos após a empresa Indeal ser acusada de aplicar mais de R$ 1 bilhão de mais de 38 mil investidores em investimentos. De acordo com a denúncia do Ministério Público Federal (MPF), cerca de R$ 448,6 milhões não foram resgatados pelos investidores, que agora enfrentam uma batalha judicial para reaver os valores.
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O caso ganhou destaque em 2019, após as investigações da Polícia Federal, que descobriram que a Indeal operava no mercado de criptomoedas sem a devida autorização do Banco Central. O envolvimento com o mercado de criptoativos se tornou um dos principais pontos da investigação, culminando na falência da empresa dois anos depois, em 2021. Desde então, os investidores têm se mobilizado judicialmente para tentar recuperar os recursos perdidos.
Paradeiro dos fundos
Amarildo Marques, técnico de informática, investiu R$ 8 mil na empresa em 2019. A oferta de rendimentos acima da média, com a promessa de retornos de até 15% no primeiro mês, atraiu o técnico, especialmente após um amigo recomendar a empresa.
Segundo o relato, este amigo, já investidor, havia obtido os lucros prometidos, o que fez Amarildo confiar na operação e seguir o mesmo caminho. Contudo, em pouco tempo, o que parecia ser uma oportunidade de investimento sólida se revelou um grande golpe: até hoje, Amarildo não conseguiu reaver um centavo do que investiu.
“A gente ganhou na justiça, enviou tudo que comprovasse, o contrato, o meu depósito, a conversa com a pessoa que intermediou lá. E aí eu tive o ganho da causa, porque eu comprovei tudo que foi investido. E depois do ganho de causa, a justiça está ali com os valores retidos e não dá uma definição. Se vai pagar quem ela vai pagar, quando vai pagar”, conta Marques.
Amarildo Marques, técnico de informática
Reprodução/ RBS TV
De acordo com a advogada Caroline Boff, que representa cerca de cem investidores, a situação permanece incerta. Ela afirma que, até o momento, ninguém recebeu qualquer valor de volta.
“A esperança do pagamento está em uma conta nos Estados Unidos, que estava em nome de um dos sócios da empresa. Nela, estavam criptomoedas, no valor que pode chegar, atualizado, a R$ 800 milhões”, relata.
Segundo Caroline, o Juiz Federal da Ação Penal autorizou a venda desses bitcoins e a ideia era que esses valores fossem para uma conta judicial vinculada à Indeal e ao processo criminal para então ser administrado pela falência.
No entanto, a venda dos criptoativos não foi confirmada, e a advogada questiona o paradeiro dos fundos.
“Até hoje a gente não tem certeza que essa venda aconteceu e onde estão esses valores. Se a venda foi efetivada, onde estariam esses valores? Ninguém sabe”, questiona Caroline.
Advogada Caroline Boff
Reprodução/ RBS TV
O que falta
O Ministério da Justiça informou que as autoridades norte-americanas confirmaram a apreensão dos bitcoins e a transferência dos fundos para um endereço controlado pelas autoridades dos Estados Unidos.
No entanto, a repatriação dos recursos ainda aguarda o trânsito em julgado da condenação criminal dos envolvidos. O objetivo é garantir o ressarcimento das vítimas, mas o processo depende da conclusão do julgamento.
O escritório que administra a massa falida da Indeal informou, por meio de uma nota, que tem tomado todas as medidas possíveis para arrecadar e vender os ativos. A massa falida atualmente possui mais de 7 mil credores, com cerca de R$ 450 milhões de créditos habilitados. (Leia abaixo na íntegra)
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região também se manifestou sobre o caso, destacando que os bens dos sócios e da empresa estão bloqueados e à disposição do juiz responsável pela falência. Além disso, informou que as providências necessárias para a repatriação dos criptoativos estão em andamento desde julho de 2023. (Veja abaixo)
Em janeiro deste ano, foi solicitado às autoridades norte-americanas informações sobre a alienação dos valores. A repatriação de criptomoedas é descrita como um processo complexo, que exige a coordenação entre os países envolvidos e depende de um julgamento definitivo, o que ainda não aconteceu, uma vez que apelações estão em análise no Tribunal desde novembro de 2024.
Ressarcimento
Em 2023, a Justiça Federal condenou os sócios da Indeal a 19 anos e três meses de prisão pelos crimes de organização criminosa, apropriação e desvio de valores de instituição financeira, gestão fraudulenta de instituição financeira e operação de instituição financeira sem autorização legal. Apesar da condenação, os sócios permanecem recorrendo da sentença em liberdade.
Com as investigações ainda em andamento, os investidores continuam esperançosos quanto ao ressarcimento. A advogada que representa os credores acredita que os pagamentos podem começar ainda em 2025, caso o processo de repatriação dos criptoativos se resolva.
“Todos têm esse sentimento, que foram enganados pela Indeal, mas eles têm uma esperança na justiça, nós todos temos, que isso vai ser resolvido, esse valor tem que aparecer”, finaliza Caroline.
Nota dos representantes da massa falida da Indeal
“A falência da Indeal Consultoria em Mercados Digitais Ltda. foi decretada pelo Juiz da Vara Regional Empresarial da Comarca de Novo Hamburgo/RS em 14/12/2022.
Desde o decreto, a Medeiros Administração Judicial, empresa nomeada pelo Juiz para condução do caso, vem tomando todas as medidas necessárias para arrecadação e venda dos ativos, entre outras providências judiciais para apuração das responsabilidades de sócios e terceiros, que detém a imensa maioria do patrimônio.
Os pedidos de habilitação apresentados pelos credores estão sendo analisados integralmente, resultando na atualização do quadro geral de credores, que conta com mais de 7 mil pedidos e cerca de R$ 450 milhões em créditos habilitados. Esse progresso é crucial, pois viabiliza o início dos pagamentos tão logo haja ativos suficientes disponíveis para essa finalidade.
A questão dos criptoativos arrecadados na falência permanece como uma das maiores complexidades do caso. Embora a sentença condenatória penal determine a disponibilização de todos os ativos ao juízo falimentar, inclusive as criptomoedas, a administração judicial tem enfrentado entraves significativos para saber do paradeiro e situação dos criptoativos.
Medidas para identificar a situação das criptomoedas estão sendo conduzidas pela administração judicial: pedidos de informações, expedição de ofícios, tentativa de instauração de procedimento de cooperação internacional próprio na falência, entre outras que correm em sigilo, estando aguardando o desfecho dessas iniciativas.
Credores que ainda não se habilitaram podem realizar o requerimento através do site: https://www.falenciaindeal.com.br/habilitacoes-e-divergencias-de-credito”
Nota do Tribunal Regional Federal da 4ª Região
“Cumpre informar que tudo o que foi objeto de bloqueio está bloqueado. Os bens dos sócios e da empresa já estão a disposição do Juiz da falência. Os demais bens aguardam a vinda da desconsideração da pessoa jurídica para atingir os demais réus.
3.537,21068616 BTC’s custodiados no exterior não estão nem nunca estiveram à disposição do juízo criminal, que solicitou assistência jurídica em matéria penal ao Governo dos Estados Unidos da América para apreensão e alienação antecipada dos ativos constritos naquele país.
Houve a apreensão dos criptoativos, havendo REGIS LIPPERT FERNANDES, TÁSSIA FERNANDA DA PAZ e FRANCISCO DANIEL LIMA DE FREITA, assinado documento elaborado pelas autoridades norte-americanas de ciência, mediante o qual foi oportunizada, inclusive, eventual contestação perante as autoridades dos Estados Unidos.
ANGELO VENTURA DA SILVA e MARCOS ANTÔNIO FAGUNDES recusaram-se a firmar o documento, mas foram cientificados pelo Juízo.
O pedido do Juízo Falimentar de que fosse requisitada às autoridades dos Estados Unidos a transferência para a conta da Massa Falida foi indeferido, porque, além de não estar à disposição da 7ª Vara Federal de Porto Alegre, até que seja repatriado, a solicitação de assistência jurídica internacional se deu em matéria penal.
As providências necessárias à repatriação dos criptoativos estão em andamento desde 03/07/2023, inclusive, já tendo sido encaminhada a sentença condenatória proferida em 29/01/2024, bem como em 27/01/2025 solicitadas informações acerca da alienação pelas autoridades norte-americanas.
A repatriação de criptomoedas é procedimento complexo, que demanda a observância de diversos trâmites formais e envolve a atuação coordenada dos Estados brasileiro e estrangeiro e depende do julgamento definitivo, o qual não ocorreu, já que pende de julgamento as apelações no TRF4 desde 08/11/2024.
Na sentença condenatória proferida pela 7ª Vara Federal de Porto Alegre, foi decretado o perdimento em favor dos terceiros lesados, dos bens, valores, ativos e criptoativos apreendidos e sequestrados, inclusive dos criptoativos ou do produto da alienação dos criptoativos que se encontram nos Estados Unidos, após o trânsito em julgado e a repatriação.
Foi fixado, para fins de reparação do dano, o valor mínimo de R$ 448.623.452,35 (quatrocentos e quarenta e oito milhões, seiscentos e vinte e três mil quatrocentos e cinquenta e dois reais e trinta e cinco centavos), em maio/2019.
Dentre os fins penais de repatriação de ativos, inclui-se a reparação de danos, sendo que o produto da alienação dos ativos poderá vir a servir para o ressarcimento das vítimas, uma vez que seja confirmada e transitada em julgado a sentença penal já proferida pela 7ª Vara Federal de Porto Alegre e que se encontra em grau recursal em razão das apelações interpostas.”
Nota do Ministério da Justiça
“O Brasil adota o modelo de Autoridades Centrais para processar pedidos de cooperação jurídica internacional, tanto em matéria criminal quanto cível. No País, essa função é desempenhada pelo Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP). Portanto, o MJSP, como Autoridade Central, acompanha o processo, que aguarda o trânsito em julgado da condenação criminal para viabilizar a repatriação dos recursos e o ressarcimento das vítimas.
O caso foi deflagrado pela Polícia Federal, em 2019, na Operação Egypto. A investigação revelou um esquema de captação irregular de investimentos em criptomoedas pela empresa InDeal Consultoria em Mercados Digitais LTDA, com sede em Novo Hamburgo (RS). Sem autorização da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e do Banco Central, a empresa operava como instituição financeira clandestina, distribuindo títulos e valores mobiliários. A operação resultou no cumprimento de mandados de prisão, busca e apreensão, além do bloqueio de ativos financeiros, imóveis e veículos de luxo.
Entre os bens bloqueados estavam ativos virtuais mantidos em uma plataforma virtual nos Estados Unidos. Em resposta a um pedido de cooperação jurídica internacional da Polícia Federal, as autoridades americanas confirmaram a apreensão dos Bitcoins e a transferência dos fundos para um endereço controlado pelas autoridades estadunidenses. Posteriormente, a Procuradoria-Geral da República solicitou a venda dos criptoativos e a remessa dos valores ao Brasil.
No início de 2024, a 7ª Vara Federal de Porto Alegre proferiu sentença condenatória no caso e responsabilizou 17 réus por crimes contra o Sistema Financeiro Nacional.”
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