RS tem 1,2 mil pedidos de Auxílio Reconstrução em nome de pessoas que constam como mortas na base de dados do governo federal


Porto Alegre lidera número de cadastros com indício de óbito nas bases de dados oficiais. Governo federal diz ter ‘malha fina’ para identificar suspeitas de irregularidades. Página de acesso ao Auxílio Reconstrução, destinado a pessoas afetadas pelas cheias no RS
g1
Dos 629,6 mil pedidos para receber o Auxílio Reconstrução, destinado a famílias atingidas pela enchente no Rio Grande do Sul, 1.262 foram feitos no nome de pessoas que constam como mortas nas bases de dados do governo federal. Os dados foram obtidos pela RBS TV e exibidos em uma reportagem no Jornal Nacional, da TV Globo, na sexta-feira (12).
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Só tem direito a receber o auxílio de R$ 5,1 mil via PIX quem foi diretamente afetado pelas cheias. As prefeituras identificam os moradores e enviam os dados para a União, que faz o repasse. No entanto, nem todos os cidadãos que constam com indício de óbito estão, de fato, mortos (entenda mais abaixo).
Segundo o ministro da Secretaria de Apoio à Reconstrução do RS, Paulo Pimenta (PT), o governo tem dois mecanismos para tentar coibir as fraudes – em uma “malha fina”. O primeiro é a proposta de publicação do nome, endereço e CPF de todas as pessoas que receberam o auxílio. O segundo é o cruzamento de dados do Censo, das contas de água e luz, além dos registros no SUS, CadÚnico e Receita Federal.
“É lamentável que, numa situação como essa, a gente tenha que enfrentar essa tentativa de fraude, que é tirar o dinheiro das pessoas que mais precisam na hora que elas mais precisam”, diz Pimenta.
Porto Alegre é a cidade com o maior número de mortos entre os pedidos do auxílio. Das 124,7 mil famílias cadastradas na capital, 862 delas teriam o responsável já falecido. Na sequência, aparecem Novo Hamburgo, Canoas e São Leopoldo, na Região Metropolitana.
Vivo consta como morto
O g1 revelou o caso de Geremias Izaias Porto Costa, morador de São Leopoldo, na Região Metropolitana, que esperava receber o auxílio, mas foi surpreendido com o aviso de que o benefício não foi liberado porque “o responsável familiar possui indicativo de óbito”.
Em 27 de maio, ele fez o cadastro para o pedido junto à prefeitura, etapa necessária para que houvesse futura avaliação e liberação pelo governo federal, e o Município enviou os dados dos habitantes ao governo federal.
Ao g1, o ministério admitiu o erro e afirmou que a Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social (Dataprev), órgão responsável pelo sistema onde o benefício é solicitado, trabalha para regularizar o CPF de Costa. Não detalhou, no entanto, como o erro aconteceu.
“É difícil. A gente precisando desse dinheiro e acontece uma coisa dessas. É muito difícil”, desabafa Costa.
Sistema do governo federal aponta que benefício não foi liberado porque homem foi dado como morto
Arquivo pessoal
Preso beneficiado e empresa fechada ‘atingida’
Em Canoas, na Região Metropolitana de Porto Alegre, o RBS TV identificou duas tentativas de acessar dinheiro da prefeitura e do governo federal. A reportagem descobriu cadastrados nos programas um homem que estava preso à época da inundação e a dona de uma salão de beleza fechado seis meses antes da tragédia.
Júnior Cechinel entrou com o pedido para receber os R$ 5,1 mil do Auxílio Reconstrução, pagos pelo governo federal, alegando ter perdido tudo com a cheia no bairro Harmonia, em Canoas. No entanto, ele estava preso na Penitenciária Modulada de Osório, no Litoral Norte, entre 28 de dezembro de 2023 e 28 de maio de 2024.
A RBS TV apurou que o homem indicou como endereço a quarta casa em um terreno no bairro. No entanto, existe apenas uma residência no local, e o único dono mudou-se provisoriamente para a casa de um parente, em Nova Santa Rita.
Após receber liberdade condicional, o homem passou a residir com o pai na praia de Quintão, em Palmares do Sul – a 136 km de Canoas. Sem saber que estava sendo gravado, ele mantém sempre a mesma versão a quem pergunta sobre a tragédia.
“Eu estava morando lá quando encheu. Me tiraram de barco”, afirmou.
Além de se cadastrar para receber o auxílio, Júnior também passou a intermediar o esquema para outras pessoas, “vendendo” endereços supostamente não reivindicados por moradores. Júnior cobra R$ 550 pelo serviço, sendo R$ 50 no ato e R$ 500 quando o dinheiro for liberado pelo governo federal. Se alguém fiscalizar, ele orienta como justificar.
Ex-detento que pediu o Auxílio Reconstrução no RS
Reprodução/RBS TV
Em outra suspeita de fraude, uma microempreendedora também se inscreveu na Prefeitura de Canoas para receber, indevidamente, dois benefícios: além do Auxílio Reconstrução, a mulher requereu uma verba destinada pelo município a microempreendedores afetados pela enchente.
Na Receita Federal, Dienifer Massena aparece como dona de uma estética no bairro Mathias Velho. No questionário que preencheu para ter acesso à verba municipal, alegou que o salão foi “muito impactado”. A água teria atingido parte do segundo piso. De acordo com Dienifer, foram perdidos computador, micro-ondas, geladeira e móveis.
O problema é que ela fechou a estética em dezembro do ano passado, cinco meses antes da catástrofe climática. E deixou isso bem claro tanto em texto quanto em vídeo publicados nas redes sociais, chegando a reclamar do ganho de peso com a mudança de endereço
“A gente foi embora, só que com isso, veio o ganho de peso. Então, eu ganhei 14 kg em dezembro, quando graças a Deus a gente conseguiu vir embora, até agora”, afirmou em vídeo.
A Prefeitura de Canoas afirma que excluiu o homem e a mulher dos cadastros de beneficiados. O município diz que a checagem dos dados apresentados em relação ao auxílio reconstrução cabe ao governo federal.
Empresária teria pedido auxílio para empresa fechada em Canoas
Reprodução/RBS TV
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